Notícias
Previsibilidade faz real virar alvo fácil de especulação
A apreciação do real é ditada pelo retorno do apetite por risco, que derruba a cotação internacional do dólar e eleva o preço de ações, metais, alimentos e moedas mundo afora.
TONI SCIARRETTA
Passado o pior da crise econômica, a taxa de câmbio brasileira voltou a  patamares próximos aos anteriores à quebra do Lehman Brothers, e o país se vê,  novamente, sem instrumento capaz de ir contra a corrente do capital  internacional e de interferir de forma eficiente na trajetória de apreciação do  real, segundo analistas.
Na avaliação de especialistas, o Brasil se tornou  uma espécie de refém desse rearranjo global e segue de mãos atadas para impedir  a redução da competitividade das exportações e promover a recuperação de setores  importantes da indústria e do agronegócio afetados pela desaceleração  econômica.
A apreciação do real é ditada pelo retorno do apetite por risco,  que derruba a cotação internacional do dólar e eleva o preço de ações, metais,  alimentos e moedas mundo afora.
A trajetória do real tornou-se tão previsível  que permite a investidores estrangeiros ganhar dinheiro com facilidade em suas  apostas em favor da moeda. Isso porque, além do retorno que têm aplicando em  renda fixa e na Bolsa de Valores, embolsam a valorização do real.
Segundo  Sidnei Nehme, diretor da corretora de câmbio NGO, a maior evidência disso é a  alta de 90,34% da Bovespa em dólares, enquanto em reais a variação está ainda em  50%.
"Quando o estrangeiro entra no Brasil, ele traz dólares, converte em  reais, e vai comprar Bovespa ou título de renda fixa. Qual seria o procedimento  lógico dele? Deveria fazer um hedge [proteção] para anular o risco cambial. Mas  ele vai no mercado futuro e aposta ainda mais na queda do dólar. Como ele sabe  que, nesse segmento, o BC não tem instrumento para intervir de forma eficaz,  joga gasolina na fogueira e trabalha para derrubar mais o dólar."
Na semana  passada, o dólar recuou 2,31% e voltou a R$ 1,822, menor valor desde 22 de  setembro. O real já subiu 27,1% neste ano, a maior alta no mundo, à frente do  dólar australiano (18,4%), do peso chileno (17,4%) e do rand sul-africano  (16,6%), segundo a Bloomberg.
O BC mantém inabalada a sua convicção de que a  política de câmbio flutuante prescinde de influência maior nas cotações e que as  eventuais intervenções visam restabelecer as condições de liquidez de mercado,  evitando que movimentos bruscos prejudiquem empresas e investidores.
Para  Nathan Blanche, sócio da consultoria Tendências, todas as tentativas de conter o  câmbio só tiveram fôlego de curto prazo e levaram o Brasil ao desastre. "Hoje,  estão pedindo recursos do governo para desvalorizar o câmbio. Em vez de atacarem  o custo no Brasil, que faz com que a vida do empresário brasileiro seja um  inferno, eles ficam pedindo esse guarda-chuva cambial furado."
A intervenção  do BC no mercado à vista, que no mês passado comprou US$ 2,164 bilhões, pouco  influenciou nas cotações. Mesmo a venda de "swap cambial reverso", instrumento  que equivale à compra de dólar futuro e cria demanda pela moeda, não eleva as  cotações.
"O BC parou com essa estratégia porque não adianta muito. Se faz  mais, incentiva mais a apreciação do real porque dá liquidez a essa aposta.  Coloca uma certeza que vai comprar. Quem vai determinar quando se deve parar é o  próprio especulador, quando vê que as cotações chegaram a um patamar  insustentável", disse Nehme.
